Até o advento da Lei Complementar nº 147 de 7/08/2014, a grande maioria das sociedades de advogados era tributada pelo regime do lucro presumido, sendo que, a partir de 2015, a nova redação dada à LC 123/06 permitiu que sociedades de advogados também pudessem fazer a opção pelo regime do Simples Nacional, mediante aplicação de alíquota progressiva incidente sobre a receita bruta.
Assim, tanto as sociedades optantes pelo Simples Nacional, quanto as sociedades optantes pelo Lucro Presumido, têm como base de cálculo a receita bruta, o que nos leva a indagar se o reembolso de despesas adiantadas pela sociedade compõe, ou não, a receita bruta tributável.
O entendimento pacífico era de que o reembolso de despesas não poderia compor a receita tributável, contudo, nos idos de 2009, a Receita Federal autuou uma sociedade de advogados, sediada em Minas Gerais, por entender que os ingressos contabilizados a titulo de “reembolso de despesas” configurariam receita tributável passível de inclusão na base de cálculo do PIS/COFINS/IRPJ/CSLL (lucro presumido).
A DRJ/BHE considerou que os valores de reembolso de despesas comporiam a receita bruta da sociedade, posto que o preço dos serviços abrangeria todo o custo envolvido na prestação de serviços advocatícios, nos termos do Regulamento do Imposto de Renda, que também seria aplicável aos outros tributos em questão.
Em julgamento colegiado, aos 25/11/2014, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) se mostrou dividido ao debater a questão, tendo prevalecido o voto de qualidade da relatora e presidente, Dra. Carla Ferreira Saraiva, que negou provimento ao recurso voluntário apresentado pela sociedade.
Em suma, a Relatora seguiu a linha de entendimento exarada pela DRJ/BHE, segundo a qual as despesas a serem reembolsadas são normais ao tipo de atividade da sociedade, ou seja, inerentes e necessárias ao êxito do fim social do escritório de advocacia, razão pela qual deveriam ser integrantes da receita bruta. Complementando tal conclusão, mencionou que só podem ser excluídos da receita bruta, conforme previsão legal, as vendas canceladas, os descontos incondicionais concedidos e os impostos não cumulativos cobrados destacadamente do comprador ou contratante, logo, o reembolso não se qualificaria como nenhuma das exclusões.
A partir de tal premissa, seguiu decidindo que, no caso em questão, a sociedade optou pela tributação a partir do lucro presumido e que em tal sistema não se pode deduzir custos e despesas operacionais, já que tal dedução seria substituída por um percentual de presunção de lucro.
Expôs que a base de cálculo do lucro presumido é a receita bruta e que o preço dos serviços prestados é a soma a pagar em dinheiro, não interessando a que título seja, pois o reembolso comporia o preço dos serviços prestados, portanto integraria a receita bruta (honorários e reembolso).
Por outro lado, a linha de entendimento encabeçada pelo conselheiro Dr. Fernando Ferreira Castellani, pareceu, aos olhos da doutrina e jurisprudência majoritária, mais coerente com o ordenamento jurídico tributário, sobretudo em relação ao balizado conceito de “receita”, que deve se restringir ao ingresso financeiro que se incorpore como elemento novo ao patrimônio da sociedade em decorrência da prestação de serviços, gerando, necessariamente, um resultado positivo.
Neste caso, o conselheiro entendeu que a opção pelo lucro presumido não ensejaria o reconhecimento dos reembolsos como receita, porquanto ausente a capacidade contributiva, que somente estaria presente na auferição de receita própria.
Entendeu o d. conselheiro que as despesas alheias à prestação do serviço intelectual jurídico devem ser consideradas reembolso, como por exemplo a taxa judicial para distribuição, autenticação de documentos, deslocamentos, devidamente comprovados por documentos oficiais (guia de recolhimento, nota fiscal ou recibos).
Ao revés, o custo do estagiário ou profissional que auxilia na confecção da peça processual, o papel, tinta de impressora, computador e aluguel do espaço utilizado (escritório), são absolutamente essenciais e diretamente vinculados à prestação contratada, devendo, portanto, ser remunerado pelos honorários profissionais, caracterizadores de receita. Os reembolsos de honorários repassados a advogados correspondentes, a princípio, não configurariam receita tributável, desde que os pagamentos não sejam habituais aos mesmos profissionais, eis que acabaria por configurar como contratação formal de empregado, ingressando, também, como custo para prestação do serviço.
Nesta linha de raciocínio, entendeu o Dr. Fernando Castellani que a caracterização dos valores como “reembolso de despesas” dependeria de efetiva comprovação documental e análise pontual, razão pela qual seu voto indicou a baixa dos autos em diligência para que fosse realizada a verificação documental dos valores indicados, o que daria suporte para um julgamento baseado nas premissas levantadas em seu voto.
De toda forma é imperioso notar que, muito embora o julgamento do acórdão 1803-002.463 tenha sido dividido, o entendimento vitorioso pelo voto de qualidade considera todos os valores recebidos na conta “reembolso de despesas” como receita bruta tributável, independente da natureza fática dos reembolsos, o que inclui custas, deslocamentos, honorários periciais, etc.
Com efeito, para melhor resguardar o interesse das sociedades de advogados optantes pelo lucro presumido ou simples nacional, é aconselhável a imediata alteração na sistemática de adiantamento de despesas pelos escritórios de advocacia, sendo prudente que o cliente pague as despesas diretamente, mediante prévio encaminhamento das respectivas guias e boletos pelo escritório.
Na eventualidade de se adotar postura distinta, a sociedade estará sujeita a autuação dos valores recebidos a título de reembolso de despesas. De toda forma, visando minimizar os riscos, é recomendado que a sociedade mantenha rigoroso registro contábil de eventuais reembolsos de despesas, atentando-se para que os respectivos comprovantes sejam emitidos pelo próprio fornecedor (recibos e notas fiscais) e minuciosamente detalhados, evitando recibos elaborados pela própria sociedade. Em caso de mudança de entendimento do CARF, tal conduta poderá justificar a dispensa de tributação dos valores recebidos a título de reembolso de despesas.